O Brasil é um país diverso. Certamente, o mais diverso e miscigenado do mundo. Se existe uma característica notória e constitutiva da nação Brasilis é a miscigenação. Diz-se: o Brasil é formado por negros, brancos e índios. Da mistura e da interação entre estas raças surgiram: o mulato, o cafuzo e o caboclo. É, pois, que o Brasil é uma nação que possui na diversidade a sua unidade. A unidade nacional é a síntese da miscigenação que constitui a própria nação. Desse modo, o Brasil não é nem branco, nem negro nem indígena. O Brasil tem por identidade a diferença. O que identifica o povo brasileiro é justamente a diferença. Diferença esta que não diferencia, mas, pelo contrário, identifica. A unidade nacional é a identidade a partir da diferença. Somos todos brancos, negros e índios e, ao mesmo passo, não somos nenhum deles — somos todos brasileiros! A história nos conta que nossa sociedade formou-se da interação das três raças. Entretanto, cada um no seu cada qual. O cada qual de cada um, não obstante, não foi resultante da arbitrariedade dos mesmos, mas, de um — o branco. O branco foi, é e há de continuar sendo o que é, se o Brasil continuar a ser o que é e sempre foi. A ordem é branca. O progresso é somente para os brancos. De há muito, branco já não mais diz uma tonalidade de cor, mas, a um modo de ser, agir e pensar. Esse modo de pensar, agir e ser refere-se à casta dominante de nosso país. Hoje, a ideologia impregnada por esta casta condicionou e possibilitou os negros e os índios embranquecerem. Se foi ou não por persuasão, ou mesmo, por iniciativa própria, é um debate que pode nos distanciar do real problema. É preciso, darmos importância ao presente — o que não quer dizer que devemos desconsiderar o passado e a história. Muito em contrapartida a isso, o que nos propomos é pensar o presente para fazermos viger o futuro. O futuro se constrói no presente. Só há o presente. Que este é resultante do passado não temos dúvida. Dúvida, também não temos de que o passado já não mais é, apesar de resguardar-se e manter-se retraído no presente. O nosso presente denota concretamente isto que acabamos de afirmar: as cotas para os negros no ensino superior é uma seqüela da história no presente. Por cota, podemos entender quantia ou parcela de um todo. Situando no aqui tratado, este todo se refere às vagas das universidades públicas. Hoje, leis e mais leis, obrigam que os negros tenham acesso ao ensino superior por meio de cotas específicas do número total de vagas onde apenas pessoas de cor concorrem entre si. Isto é bom? Podemos achar isto racismo? Tal atitude é uma forma invertida de segregação? Todo e qualquer negro está apto a passar num vestibular? Se meditarmos seriamente, chegaremos à uma infinidades de questões. Sensatamente, procuraremos nos prender num fio condutor: a realidade do negro. Vejamos: se o Brasil é um país desigual e a desigualdade mostra-se a partir das diferenças, e estas, por meio da realidade concreta de nossa sociedade, porque os negros estão recebendo esta “benção” de nossos legisladores e da própria sociedade? Por que a cota é um dentre outros atenuadores do racismo e do preconceito de nossa sociedade embranquecida. As cotas não vão resolver os problemas dos negros. As cotas não deixam de ser uma medida válida, mas também, não tratam da questão com a dignidade e seriedade devida. — É um primeiro passo! Mas o povo, os carentes, os negros não serão atendidos pelas cotas. As cotas são benefícios — não temos dúvida. Agora, será que todos são beneficiados? Meditemos: se, para fazer o vestibular é necessário ter no mínimo o nível médio e, para passar no mesmo, é necessário estar preparado para superar a avaliação e a concorrência, quantos negros carentes chegam a concluir o nível médio e destes, quantos têm condições de “passar” no vestibular? As cotas amenizam, mas não resolvem. A sociedade brasileira precisa de ações que realmente tenham consistência social. Um “punhado” de negros carentes nas universidades não mudará muita coisa. O negro precisa de dignidade. O negro não quer ser diferenciado. O negro quer andar com as próprias pernas. Quer conquistar a partir de seus próprios passos. O negro quer oportunidade, contudo, não por ser negro, por ser de cor. O negro, o pobre, o carente querem ser. Querem ser como todos devem ser: como cidadãos. A cidadania não é expressa por cotas. As cotas não dão aos negros o direito à cidadania; é um paliativo. O negro quer escola, quer professores, quer infra-estrutura, quer a qualidade como princípio de justiça social. O negro quer ser cidadão sendo negro. O negro não quer privar-se de si mesmo para ser cidadão duma sociedade onde poucos têm o direito de assim ser. Uma vez mais frisamos: a cota é um primeiro passo, mas não é uma atitude que denota o acesso à cidadania de forma indistinta e coletiva. A cota é um paliativo, mas a verdadeira cura é a cidadania, a justiça e a igualdade social.
FONTE: http://www.faced.ufba.br/rascunho_digital/textos/279.htm
Por: Fábio Soares Gomes
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário